terça-feira, 13 de janeiro de 2015

MARIETA SEVERO - A DAMA DO TEATRO E SUAS AVENTURAS NA TV

Para toda uma nova geração, que desconhece sua vasta e brilhante experiência em teatro, que vai desde sua colaboração com o ex-marido Chico Buarque em "Roda viva" e "Ópera do malandro" até seu encontro com Andréa Beltrão na fundação do Teatro Poeira e na peça "As centenárias", de Newton Moreno e a premiada montagem de "Incêndios" - passando pelo casamento profissional com o dramaturgo Naum Alves de Souza em quatro peças nos anos 80 - Marieta Severo vai ser conhecida sempre como Dona Nenê, a matriarca que interpretou de 2001 a 2014 na segunda versão da série "A grande família". É uma pena, no entanto, que uma atriz de sua estatura, capaz de saltar do humor mais sofisticado ao drama mais devastador em poucos minutos, tenha que ficar marcada por um papel tão pouco desafiador. Hoje com 68 anos de idade, Marieta tem uma carreira extraordinária em todos os veículos possíveis - no cinema marcou presença nos clássicos setentistas "Chuvas de verão" e "Bye bye, Brasil", de Cacá Diegues, no drama familiar "Com licença, eu vou à luta", de Lui Faria e como Lucinha Araújo em "Cazuza, o tempo não para", de Walter Carvalho e Sandra Werneck - isso sem mencionar "Carlota Joaquina, princesa do Brazil", de Carla Camuratti, considerado o marco inicial da retomada do cinema nacional que vem se mantendo até hoje. E na televisão, fez parte de alguns dos grandes sucessos de audiência da Globo, intercalando humor e sensibilidade sempre com uma dose inegável de charme.

Sua estreia na Globo se deu quando ela ainda não tinha completado vinte anos. Em "O Sheik de Agadir" (66), da cubana Gloria Magadan, ela deu vida à Éden, uma princesa árabe que, apesar do aspecto frágil, se revelava, no final, uma assassina cruel que eliminava suas vítimas enforcadas - coisas absurdas que Magadan fazia constantemente. O exílio voluntário ao lado de Chico em 1969 - que a fez dar à luz à sua filha Sílvia (que também se tornaria atriz) na Itália - também a manteve afastada da TV por uma longa década. Seu retorno aconteceu na minissérie "Bandidos da falange", de Aguinaldo Silva e Doc Comparato, em 1983, mesmo ano em que viveu Dinah, uma das suspeitas de um crime do passado na novela "Champagne", de Cassiano Gabus Mendes - era divertidíssimo testemunhar seus embates com o filho Greg (Cássio Gabus Mendes), que voltava da Europa como punk nos primórdios do movimento no Brasil. Em 1984, exercitando sua veia cômica, ela interpretou Catarina, a filha mais velha do empresário interpretado por Walmor Chagas na novela "Vereda tropical", de Carlos Lombardi. Seu dueto com Maria Zilda - que vivia sua irmã Verônica - era impagável e, sob a direção de Guel Arraes (que viria a dirigí-la em episódios da série "A comédia da vida privada", nos anos 90) ela mostrou que sabia ser engraçada.


Em 1985, Marieta voltou a trabalhar com Cassiano Gabus Mendes na primeira versão de "Ti-ti-ti", novamente como a mãe do filho do autor. Ela era Suzana, a ex-mulher de Ariclenes (Luiz Gustavo), que vivia uma relação de carinho com o pai de seu filho Luti (no remake de 2000 o papel foi de Malu Mader, que nessa versão interpretava Valquíria, namorada do rapaz). Sua volta às telinhas se deu quatro anos mais tarde, mais uma vez com o genial texto de Cassiano. Em "Que rei sou eu?", ela mostrava seu lado político e ativista na pele de Madeleine de Bergeron, a pré-feminista que colocava fogo no reino de Avilan com seus escritos conclamando as mulheres a lutarem por seus direitos e que lutava contra a própria rainha Valentine (Tereza Rachel) para manter ao seu lado o marido (Daniel Filho), conselheiro da moeda do país em crise.

O horário das 19h manteve Marieta em 1992, mas dessa vez em um papel bastante diferente. Em "Deus nos acuda", de Sílvio de Abreu, ela deu vida à Elvira, a vilã da história, e mostrou que quando má ela era ainda melhor do que quando era heroína. Gilberto Braga - o autor que melhor sabe criar vilões na tv brasileira - aproveitou a deixa e deu a ela a pérfida Loreta Pellegrini em sua novela seguinte, "Pátria minha" (94), que infelizmente não se tornou o sucesso esperado. Mesmo assim, Marieta não deixou a peteca cair e roubava cada cena em que aparecia. Depois desse espetáculo particular, o público só foi reencontrar Marieta em seis anos, como Alma, a possessiva tia de Edu (Reynaldo Giannechini), na novela "Laços de família". Sua personagem, que era casada com o mulherengo Alexandre Borges, acabava surpreendendo a audiência no final da trama, quando adota os gêmeos que o marido tem com a empregada doméstica que morre no parto - cenas emocionantes que lhe proporcionaram um prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte. Um dia após o final das gravações, Marieta já encarnava Dona Nenê e o resto é história...

Dispensada do papel que lhe fez companhia por mais de dez anos, Marieta Severo está sendo cogitada para integrar o elenco do próximo trabalho de Walcyr Carrasco (Deus nos defenda). A novela talvez não vá ser grande coisa - o currículo do autor não é empolgante - mas vê-la diariamente nas telinhas esbanjando talento será um enorme prazer.

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