quinta-feira, 10 de novembro de 2016

DENISE FRAGA - TALENTO EM TODAS AS FRENTES


Quem foi pego de surpresa com a aparição de Denise Fraga nos primeiros capítulos da novela "A lei do amor" como a sofrida e doente mãe da protagonista Helô (então interpretada por Isabelle Drummond) pode até não saber, mas a atriz, mais conhecida por seu talento cômico - reforçado por anos à frente de quadros do "Fantástico", como "Retrato falado" e "Norma", ambos dirigidos por seu marido, Luiz Villaça - também não brinca em serviço quando o negócio é fazer chorar. Na minissérie "Queridos amigos" (2008), de Maria Adelaide Amaral, por exemplo, ela emocionou o público na pele de Beatriz, uma sobrevivente da ditadura militar, e no cinema e no teatro, explora com maestria sua tendência em equilibrar no mesmo personagem o que ele tem de humor e drama. Em seu filme mais recente, "De onde te vejo" (novamente sob o comando do marido), ela e Domingos Montagner dão um show, equilibrando pura comédia com cenas românticas e dramáticas na medida certa - uma característica que faz dela uma das grandes atrizes de sua geração.


Carioca de nascimento e paulista por afinidade, Denise Fraga nasceu em 15 de outubro de 1964 e em 1986 já conheceu o sucesso absoluto de público ao interpretar Olímpia, a empregada doméstica que tornou-se mania no teatro, graças à peça "Trair e coçar, é só começar", de Marcos Caruso e Jandira Martini. Seu brilhante desempenho fez do espetáculo um êxito inquestionável e lhe ocupou por longos seis anos. Nesse meio-tempo, ela também começou a cativar o público televisivo: primeiro como a hilariante Lalinha, irmã de Luiz Fernando (Paulo Castelli), na novela "Bambolê" (87/88), de Daniel Más; e depois como a funkeira Ritinha em "Barriga de aluguel" (90/91), de Glória Perez. Entre as duas novelas, exercitou seu lado comediante na segunda fase do saudoso "TV Pirata", e só retornou de vez à Globo em 2000 como Meg, em "Uga uga", de Carlos Lombardi. Nesse longo período, não se afastou da televisão - fez duas novelas no SBT, "Éramos seis" (94) e "Sangue do meu sangue" (95) - nem do teatro, além de ter começado também um caso de amor com o cinema. Seu trabalho no filme "Por trás do pano", de 1999, lhe rendeu prêmios nos festivais de cinema de Gramado e Havana, além da estatueta do Grande Prêmio Cinema Brasil. E esteve também no elenco do grande sucesso "O Auto da Compadecida" (2000), de Guel Arraes, que deu certo tanto na televisão quanto nas salas de cinema.

Com a carreira em nova e vitoriosa fase, Fraga embarcou de vez na sétima arte, com produções despretensiosas como "Cristina quer casar" (03) e "Como fazer um filme de amor", e tornou-se protagonista de quadros especiais do "Fantástico", que misturavam dramaturgia com reportagem. "Retrato falado" permaneceu no programa por cinco anos, sendo substituído ´em 2006 por "Copas de Mel", em 2007 por "Te quiero, América", e em 2009 por "Norma". Em 2008, encarou seu primeiro papel totalmente dramático na TV, na já citada "Queridos amigos" - e parecia estar reinventando-se diante do grande público (aquele que não frequenta teatro regularmente e tem certas restrições ao cinema nacional). Virou protagonista em série de TV por assinatura ("Três Teresas", da GNT), encarou outro personagem assombrado pela ditadura, no filme "Hoje", de Lúcia Murat, e viu sua série "A mulher do prefeito", que fez ao lado do veterano Tony Ramos, ser indicada ao Emmy internacional. No teatro, esteve recentemente em três peças aplaudidas pela crítica e pelo público: em "Sem pensar", falava sobre o afastamento das famílias em um mundo cada vez mais regido pelo virtual; em "Chorinho", ao lado de Cláudia Mello, vivia uma sem-teto que fazia amizade com uma aposentada de classe média; e em "Galileu Galilei", desafiou as normas ao interpretar um personagem masculino: o próprio cientista considerado herege pela Igreja católica. Um desafio até pequeno para quem já encarou até mesmo a icônica "Procurando Godot", de Samuel Beckett e não tem medo de enfrentar desafios.

Uma das atrizes mais carismáticas e talentosas do Brasil, Denise Fraga é um caso raro de intérprete que não precisou atrelar seu nome às novelas para firmar-se e conquistar o público. Transitando livremente entre os mais diversos veículos - sempre imprimindo sua personalidade a cada trabalho - tem seu nome reconhecido e admirado a cada aparição na telinha. Impossível não gostar!

terça-feira, 8 de novembro de 2016

"HAJA CORAÇÃO" - MUITOS ALTOS E POUCOS BAIXOS


A Globo tem um histórico complicado em relação aos remakes de suas novelas. Para cada caso de sucesso - como "Ti-ti-ti", que Maria Adelaide Amaral reescreveu em 2010 mantendo o frescor e lhe conferindo personalidade própria e "O rebu", que atualizou a obra de Jorge Andrade com inteligência e ritmo - existe uma lista de produções constrangedoras, como "Irmãos Coragem" (95), "Pecado capital" (98) e "Saramandaia" (13), que, por motivos os mais variados, não conseguiram manter a qualidade dos originais e decepcionaram os noveleiros de plantão. Portanto, quando foi anunciado que a emissora estava em vias de regravar "Sassaricando", escrita por Sílvio de Abreu em 87/88, muita gente colocou as barbas de molho. Primeiro porque a novela original não foi um sucesso tão retumbante assim - apesar de legar à teledramaturgia algumas personagens icônicas, como Tancinha e Fedora Abdala e jogar suas intérpretes Cláudia Raia e Cristina Pereira direto no saudoso "TV Pirata", ao lado do colega de elenco Diogo Vilela. Segundo porque o autor escalado para a missão, Daniel Ortiz, só tinha no currículo uma única novela como titular, a agradável "Alto astral" (14). E terceiro porque a última vez em que uma trama de Abreu tentou voltar às telinhas o resultado foi a desastrosa "Guerra dos sexos" (12), que simplesmente ignorou as mudanças ocorridas nas três décadas que separavam as duas versões e tornou-se um fiasco vergonhoso.

A notícia de que Ortiz não escreveria um remake normal, e sim faria uma espécie de reinvenção da trama não ajudou muito. Era uma decisão questionável, mas a estreia da novela, em maio, deixou claro que foi a mais apropriada. Ao manter algumas ideias centrais intactas e modificar outras, ao alterar a personalidade de alguns personagens e acrescentar outros (além de roubar a Shirley interpretada com graça por Sabrina Petraglia de outra novela de Sílvio de Abreu, a polêmica "Torre de Babel", de 1998), Daniel Ortiz conseguiu o que parecia impossível: melhorar a novela original, limando da sinopse uma trama policial desnecessária (que envolvia um marido misterioso para a protagonista Rebeca, vivida então por Tônia Carrero), enfatizando seu humor e espalhando elementos clássicos de folhetins (segredos, amores proibidos, vilões cruéis) por uma agradável temporada de seis meses que jamais esbarrou nas temidas barrigas e ainda proporcionou bons momentos a quem buscava um entretenimento leve e despretensioso em frente à TV.  Apesar do último capítulo sofrível - apressado, com alguns buracos e um desfecho romântico que desagradou à muita gente - "Haja coração" termina sua trajetória com um crédito considerável e que mostra que seu autor, equilibrando com sabedoria tudo que se espera de uma telenovela e algumas novidades que conquistam um público menos paciente, tem um futuro promissor.

No final, entre mortos e feridos salvaram-se (quase) todos. Entre altos (muitos) e baixos (poucos), "Haja coração" divertiu e prendeu a atenção dos fãs de uma boa novela, que ofereceu tudo que algo do gênero não pode se furtar a oferecer: romance, drama, humor e uma pequena dose de suspense. Vamos agora destacar o que vai deixar saudades e o que já vai tarde.

EM ALTA:

MARIANA XIMENES: Linda e talentosa, Ximenes fez o que parecia impossivel: reviver um dos personagens mais marcantes da carreira de Cláudia Raia, a sexy feirante Tancinha. Sem exagerar nos trejeitos - o que poderia lhe empurrar para uma caricatura pouco apropriada para nossos tempos - a atriz já mostrou nos capítulos iniciais que não estava para brincadeira, e conquistou o público com seu carisma inegável. Com uma participação especial como ela mesma, a própria Cláudia Raia deu a bênção à nova versão de sua inesquecível personagem.





TATÁ WERNECK & GABRIEL GODOY: Outro desafio cumprido com louvor, graças à química impecável entre seus dois atores. Tatá saiu-se bem até mesmo em cenas dramáticas, e Gabriel - que trabalhou com o autor em "Alto astral", como Afeganistão - se revelou um dos nomes mais quentes da nova geração. Interpretados por Cristina Pereira (outra que também aprovou a substituta contracenando com ela) e Diogo Vilela em 1987, Fedora Abdala e Leonardo Raposo foram responsáveis por alguns dos momentos mais engraçados da trama e certamente serão recompensados com a memória do telespectador.


SABRINA PETRAGLIA & MARCOS PITOMBO: A maior trama romântica de "Haja coração" surpreendeu até a própria emissora, que viu o quadrilátero amoroso Tancinha-Beto-Tamara-Apolo ser eclipsado por uma história de amor pura e nos moldes de Cinderela, com direito até mesmo a armações malignas de inimigas cruéis e prepotentes. Importada de "Torre de Babel", Shirley conquistou o público com seu coração puro e altruísmo à toda prova - e seu príncipe encantado também não fez por menos, mostrando-se um cavalheiro até as últimas consequências.

REFERÊNCIAS A OUTRAS TRAMAS: Como bom fã de novelas, Daniel Ortiz recheou sua história com referências bastante divertidas a outras obras da Globo. Exemplos? Quando Safira (Cristina Pereira) anuncia sua iminente chegada ao Brasil, os closes em seus olhos e boca enquanto fala ao telefone remetem à vilã-mor da dramaturgia nacional, Odete Roitman (Beatriz Segall), de "Vale tudo". Mais um? O grupo de fãs de BBB que confundem Rebeca (interpretada por Malu Mader) com a própria atriz, para desespero de sua amiga Leonora (Ellen Roche, ótima), eliminada do reality show antes mesmo de entrar na casa. Lances assim, mais momentos de metalinguagem ("Esse bordão é de outro núcleo!", brada a autoritária Teodora (Grace Gianoukas) em determinado momento) surpreendiam o espectador e serviam como motivo de riso inteligente.

NOVOS ROSTOS: Toda novela tem sua cota de novos atores, como forma de renovar o elenco para futuras produções. "Haja coração" não fugiu à regra, apresentando novos rostos ao lado de veteranos consagrados, como Alexandre Borges, Malu Mader e Marisa Orth (sensacional em registro dramático). Destaque para o já citado Gabriel Godoy, o excelente Paulo Tiefenthaler (como o hipocondríaco Rodrigo), o pouco aproveitado Johnnas Oliva (como o rejeitado Enéas) e Renata Augusta, dona de ótimos diálogos como a doméstica Dinalda. São nomes que o público espera rever em breve.

EM BAIXA:

MALVINO SALVADOR & JAYME MATARAZZO: Dois dos piores atores já escalados para novelas globais, foram responsáveis por alguns dos momentos mais constrangedores da trama. Malvino construiu um Apolo absolutamente inexpressivo (se bem que no original o papel era de Alexandre Frota, ou seja...) e repleto dos trejeitos irritantes que vem mostrando em toda a sua carreira. Suas cenas eram quase intragáveis - em especial ao lado de uma Cléo Pires particularmente sem sal. E Matarazzo, logicamente, só está onde está por puro e simples nepotismo. Basta dar uma olhada em seu "desempenho" em "Cheias de charme", reprisada à tarde, para ver que ele é sempre o mesmo chato canastrão. E contracenar com a fraquinha Agatha Moreira não ajudou em nada.

O FINAL ABRUPTO: Tudo parecia estar em perfeito controle. Daniel Ortiz conseguiu dar conta de todas as subtramas que criou, resolvendo-as aos poucos, sem deixar tudo para o final, como normalmente acontece em outras produções. E então, nos últimos capítulos, algo desandou. Fatos importantes - como o julgamento e a cirurgia de Shirley e o desfecho do reencontro entre Francesca (Marisa Orth) e Guido (Werner Schunemann) - foram praticamente ignorados ou tratados sem a devida importância. Um pequeno tropeço, mas que não chega a apagar as qualidades dos meses anteriores - e mais um aviso à Globo para que se preocupe um pouco mais com os finais de suas novelas.